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"Não é nada humilde insistir em ser quem não somos.". (Thomas Merton)"»♥«

«Quaisquer que sejam teus sofrimentos, a vitória sobre eles está no silêncio.»(Abade Pastor) »♥«

sexta-feira, setembro 14

É necessário transferir ao Cristo o amor por nós mesmos

"Se sairmos de nós mesmos, o que encontraremos?" pergunta o bispo Teófano, o Recluso. E ele próprio dá, imediatamente, a resposta: "Encontramos Deus e o próximo." Essa é a verdadeira razão pela qual a negação de si mesmo é uma condição — e a principal — que deve ser cumprida por quem procura a salvação no Cristo: é assim que o centro de gravidade de nosso ser se pode deslocar de nós para o Cristo, que é, a um só tempo, Deus e nosso próximo. Isso significa que toda a solicitude, todo o cuidado, todo o amor que prodigalizamos a nós mesmos é, pois, sem que percebamos, completa e naturalmente transferido para Deus e, por ele, para o nosso próximo. Só então é que poderás fazer o bem de modo que "... não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua esmola fique em segredo" (Mt 6:3-4). Até que isso se realize, não será possível estar "... repletos de todo conhecimento e em grau de vos poder admoestar mutuamente" (Rm 15:14), de modo real, não apenas material. Todas as nossas tentativas nesse sentido são deformadas na base, porque são "nossas" e procedentes do nosso desejo, de nos agradar. É particularmente necessário compreender bem isto; senão, corremos o risco de nos desviar com facilidade, entrando pelo caminho de um pretenso devotamento aos outros e em obras bem intencionadas, mas que nos conduzem inevitavelmente ao lodaçal de nossa própria satisfação. Por conseguinte, não te ocupes demais com vendas de caridade, reuniões de obras assistenciais e de outras
atividades semelhantes. A agitação, sob todas as suas formas, é um temível veneno. Sonda o teu coração, examina-te com cuidado, e reconhecerás que muitas dessas atividades em que parece que nos doamos aos outros, procedem, na realidade, da necessidade de atordoar nossa consciência; sua verdadeira origem é a nossa invencível tendência de procurar o que nos agrada e nos satisfaz (cf. Rm 15:1). Não; o Deus de amor, de paz e de total sacrifício não pode estar onde se procura a própria satisfação, no barulho e na agitação, mesmo sob nobres pretextos. Este é um princípio de discernimento: se a paz do teu espírito se perturba; se estás desanimado ou um pouco irritado, porque uma razão qualquer te obrigou a renunciar a uma boa obra, para a qual tinhas projetos, isso mostra que a sua origem era equívoca. Talvez te perguntes: por quê? Os homens que têm experiência da vida espiritual responderão que os obstáculos e as oposições exteriores só podem atingir os que não entregaram a Deus a própria vontade. É impensável que Deus tenha pela frente um obstáculo. Ora, um ato realmente desinteressado não é "meu," mas sim de Deus; nada pode impedir a sua realização. São apenas os meus próprios projetos, meus próprios desejos — estudar, trabalhar,
descansar, comer, prestar serviço ao meu próximo — que podem ser contrariados por circunstâncias exteriores. Então, eu me entristeço. Mas, para quem descobriu o caminho estreito que conduz à vida, isto é, a Deus, só resta um obstáculo possível: sua própria vontade pecadora. Se quer fazer alguma coisa, mas não pode levá-la a bom termo, por que se entristecerá? Aliás, ele já não faz projetos (cf. Tg 4:13-16). Mas este é um outro segredo dos santos. Não te iludas. Um cristão deve "... andar como ele (Cristo) andou" (1Jo 2:6), ele, que jamais procurou a sua vontade (cf. Jo 5:30), mas nasceu sobre a palha, jejuou quarenta dias, passou longas noites em oração, curou doentes, expulsou demônios, não tinha onde pousar a cabeça, e finalmente foi cuspido, flagelado e crucificado. Pensa, o quanto estás longe dele! Pergunta continuamente a ti mesmo: Passei uma única noite velando e orando? Jejuei um só dia? Expulsei um único demônio? Deixei-me insultar e bater sem resistir? Realmente crucifiquei a minha carne (cf. Gl 5:24)? Renunciei a buscar a minha vontade? Tenhas sempre presente, tudo isso, em teu espírito. Por que é necessário negar-se a si mesmo? Porque aquele que verdadeiramente se negou a si mesmo já não se perguntará: Sou feliz? Estou contente? Tais perguntas não se colocarão mais diante de ti, se de fato tiveres negado a ti mesmo. Com efeito, fazendo isso, terás ao mesmo tempo abandonado todo desejo de procurar a tua satisfação própria, na terra ou no céu. Essa vontade obstinada de encontrar a própria satisfação, é a causa da inquietação e da divisão da tua alma. Abandona-a e luta contra ela: o resto te será dado sem esforço.

É necessário estar sempre vigilante contra as repetidas ofensivas do inimigo


As primeiras vitórias sobre ti mesmo devem ter, para ti, valor de sinal: agora estás no bom caminho. Mas não te consideres virtuoso; apenas agradece a Deus, pois foi ele que te deu força; não te alegres em demasia, mas apressa-te em prosseguir na tua estrada. Senão, o demônio vencido reerguerá a cabeça e te pegará pelas costas.
Lembra-te do mandamento que os israelitas tinham recebido de Deus, para te servir de lição: "... Quando tiverdes atravessado o Jordão, em direção à terra de Canaã, expulsareis de diante de vós todos os habitantes da terra. (...) aqueles que deixardes dentre eles se tornarão espinhos nos vossos olhos e aguilhões nas vossas ilhargas" (Nm 33:51-52,55). A aparente importância dessa vitória sobre ti mesmo conta pouco. Pode-se tratar de suprimir o cigarro da manhã, ou até de uma coisa — à primeira vista tão insignificante — como não voltar a cabeça ou evitar uma troca de olhares. O que importa não é o que se vê de fora. As pequenas coisas podem ser grandes, e as grandes, pequenas. Mas, é preciso estar sempre à espera de uma nova fase do combate. Deves estar sempre pronto. Não há tempo para descansar. Além disso, ainda uma vez, permanece em silêncio. Que ninguém saiba o que se passa em ti. Trabalhas para o Ser invisível. Que teu trabalho seja invisível. Os santos nos dizem que, se jogarmos migalhas em torno de nós, elas serão avidamente recolhidas pelos pássaros enviados pelo diabo. Fica sempre alerta contra a vanglória: de um bocado, ela pode devorar o fruto de muitos trabalhos. Por isso, os Padres aconselham discernimento no agir. De dois males, escolhe o menor. Se estás sozinho, escolhe o que há de mais humilde; mas se alguém te observa, toma um caminho intermediário, para atrair a atenção o menos possível. Fica o mais escondido e despercebido que puderes; que seja esta a tua regra em qualquer circunstância. Não fales de ti mesmo; não contes como dormiste, o que sonhaste, o que te aconteceu; não dês tua opinião sem que a peçam; não faças confidências sobre tuas preocupações e cuidados. Tais assuntos de conversa só te podem incitar a te ocupares excessivamente de ti mesmo.
Não mudes nada na tua casa, no teu trabalho, nem nas outras coisas. Lembra-te de que não há lugar, nem ambiente, nem qualquer circunstância exterior, que não seja própria ao combate que empreendeste. A única exceção seria uma ocupação que favorecesse diretamente os teus vícios. Não procures situações nem títulos importantes; quanto mais humilde for o teu estado e mais te puseres a serviço dos outros, mais livre serás. Fica satisfeito com a tua condição atual. Não tenhas pressa de fazer valer os teus conhecimentos e o teu saber-fazer. Evita observações; não digas: "Assim não, nem assim... Faz assim, e deste outro modo." Não contradigas ninguém, não discutas com ninguém, deixa que os outros sempre tenham razão. Não prefiras nunca a tua vontade à dos outros. Isso te ensinará a difícil arte da submissão e, ao mesmo tempo, da humildade. Ela é indispensável.
Recebe as advertências sem recriminações. Dá graças quando és desprezado, esquecido, ignorado. Porém, não cries ocasiões de humilhação: elas te serão fornecidas ao longo do dia, à medida que delas necessitares. Às vezes se notam pessoas que conservam sempre a cabeça baixa e forçam situações para se colocarem em último lugar. Então, talvez digas: "Como ele é humilde!" Mas o verdadeiro humilde tem a arte de não se deixar notar. O mundo não o conhece (1Jo 3:1). Para o mundo ele é, o mais das vezes, "um zero." Quando Pedro e André, Tiago e João largaram as redes e seguiram Jesus, o que pensaram os companheiros que eles abandonavam à beira do lago? Para estes, os outros discípulos não existiam mais; tinham ido embora. Não hesites, não temas desaparecer, tu também, longe "desta geração adúltera e pecadora." Que desejas ganhar: o mundo, ou tua alma? (cf. Mc 8:34-38). Ai de vós, quando todos vos bendisserem! (cf. Lc 6:26).

A vitória sobre o mundo


São Basílio, o Grande, disse: "Não nos podemos aproximar do conhecimento da verdade, com o coração inquieto."
Por isso nos devemos esforçar para evitar tudo o que agita o nosso coração, tudo que é causa de falta de atenção, de super excitação, tudo o que desperta as paixões ou nos torna ansiosos. Na medida do possível, devemos nos libertar do barulho, da agitação e da inquietação que se produzem por objetos sem importância. Pois, quando servimos ao Senhor, não nos devemos "inquietar e agitar por muitas coisas," mas lembrar sempre que "uma só é necessária" (Lc 10:41-42).
Para tomar banho, é preciso despir-se. O mesmo acontece com o nosso coração: ele deve ser libertado de todos os revestimentos exteriores deste mundo, para que possa ser atingido por Aquele que deve purificá-lo. Os raios benfazejos do sol só poderão agir sobre a pele, se esta a eles se expuser a descoberto. Assim é também com a virtude salutar e vivificante do Espírito Santo. Portanto, deves despir-te. Recusa a ti mesmo — mas sem que seja excessivamente visível — tudo o que causa gozo e prazer, bem-estar e distração; tudo o que diverte ou satisfaz aos olhos, aos ouvidos, ao paladar e aos outros sentidos. "Quem não está a meu favor, está contra mim" (Mt 12:30). Despoja-te, dia após dia, de tuas necessidades e de teus hábitos, no campo das relações sociais; faze-o calma e refletidamente, sem rupturas por demais bruscas, mas, no entanto, de maneira radical. Elimina pouco a pouco tudo o que puderes dos laços que te prendem ao mundo exterior: convites, concertos, recepções e, de modo geral, "tudo o que há no mundo — a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e o orgulho das riquezas — ", pois tudo isso "não vem do Pai, mas do mundo" (1Jo 2:16), e combate contra nossa alma. O que é, pois, o mundo? Não o imaginemos uma realidade exterior e tangível, que carrega a marca do pecado. O mundo, diz São Macário do Egito, é a cortina de chamas que circunda o coração e fecha o acesso à árvore da vida.
O mundo é tudo aquilo a que estamos apegados e que nos traz satisfações terrenas; é o que, em nós, "não conheceu a Deus" (cf. Jo 17:25).
Nossos desejos e impulsos fazem parte do mundo. Santo Isaac, o Sírio, enumera-os: atração pelas riquezas; propensão a acumular e a apropriar-se de todos os tipos de objetos; inclinação para os gozos sensíveis; desejo de ser objeto de honras, de onde procede a inveja; desejo de dominar os outros e de se fazer escutar; orgulho da glória e do poder; preocupação por ser admirado e amado; sede de louvores; preocupação com o bem-estar do corpo. Todas essas coisas provêm do mundo; elas se associam contra nós para nos enganar e nos conter em pesadas correntes. Se queres libertar-te, examina-te com a ajuda dessa lista e vê claramente contra o que tens de lutar para te aproximares de Deus. Pois ".. a amizade com o mundo é inimizade com Deus. Assim, todo aquele que quer ser amigo do mundo torna-se inimigo de Deus" (Tg 4:4). Os largos horizontes só se descobrem aos olhos se abandonarmos os vales estreitos, com as ocupações e os prazeres que lhe são próprios. "Ninguém pode servir a dois senhores" (Mt 6:24); é impossível permanecer, ao mesmo tempo, no vale e nas alturas. Para poderes subir com maior facilidade, e para te aliviares o mais rapidamente possível do teu pesado fardo, faz a ti mesmo, com freqüência, perguntas como esta: "Não é para o meu próprio prazer, mais do que para o dos outros, que vou a esse concerto, ou ao cinema? É crucificar a minha carne, ir a essa festa? É vender tudo o que tenho, fazer essa viagem de recreio ou comprar esse livro? É tratar duramente o meu corpo e reduzi-lo à servidão (1Cor 9:27), deitar-me para ler? Essa lista de perguntas pode ser modificada ou aumentada, em função dos teus hábitos e da relação deles com o modo de viver que o Evangelho prescreve. E lembra-te de que "quem é fiel nas coisas mínimas, é fiel também no muito, e quem é iníquo no mínimo, é iníquo também no muito" (Lc 16:10). Não temas o sofrimento: ele é que te ajudará a sair desse vale estreito em que vives nos desejos da carne, satisfazendo as vontades da carne e dos pensamentos condenáveis (cf. Ef 2:3). Faze a ti mesmo essas perguntas, sem descanso. Mas, faze-as apenas a ti. Jamais, em caso algum, nem mesmo em pensamento deves fazê-las em relação aos outros. No mesmo instante em que fizeres uma pergunta desse gênero a respeito de alguém, te erigirás em juiz, e por isso tu mesmo serás julgado. Serás despojado do que tinhas ganho com teus esforços. Tinhas dado um passo à frente, mas acabas de dar dez para trás. Então, tens mesmo razão de chorar por tua obstinação, pela queda dos teus progressos e por teu orgulho.

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