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sexta-feira, setembro 14

A Oração de Jesus

O abade Isaías disse que a Oração de Jesus é um espelho para o espírito e uma lâmpada para a consciência. Também a compararam a uma voz tranqüila, ressoando numa casa perpetuamente: todos os ladrões que tentam entrar, fogem ao perceber que alguém está acordado. A casa, é o coração; os ladrões, as sugestões más. A oração, é a voz de quem está montando guarda. Porém, aquele que vela, já não sou eu; é o Cristo. A atividade espiritual encarna o Cristo na nossa alma. Ela implica uma contínua lembrança de Deus: ele permanece escondido em ti, na tua alma, no teu coração, na tua consciência: "Eu dormia, mas meu coração velava" (Ct 5:2). Ainda que eu esteja dormindo, ou deva ocupar-me de outra coisa, meu coração continua fixo na oração, isto é, na Vida Eterna, no Reino dos céus, no Cristo. As raízes do meu ser estão firmemente plantadas no solo que as alimenta. O meio de chegar a essa oração é a invocação: "Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tem piedade de mim, pecador." Repete-a em voz alta, ou apenas mentalmente, com tranqüilidade, devagar; mas com atenção, com o coração tão livre quanto possível de tudo o que não se harmonize com ela. Não apenas as inquietações terrenas não se conciliam com essa invocação, mas também toda preocupação ou qualquer esperança de ouvir uma resposta; toda visão interior, a impressão de sentir alguma coisa, os devaneios românticos, as perguntas curiosas e o jogo da imaginação. A simplicidade é uma condição indispensável, bem como a humildade, a sobriedade do corpo e do espírito e, de modo geral, tudo o que implica o combate invisível. Os principiantes, em particular, devem estar vigilantes contra tudo o que se assemelhe à mais ligeira tendência ao misticismo. A Oração de Jesus é uma atividade, um esforço prático, e um meio que possibilita o acolhimento e o emprego dessa força que se chama Graça de Deus — sempre presente nos batizados, embora escondida — para que ela produza fruto. A oração faz frutificar essa força em nossa alma; ela não tem outro objetivo. É um martelo que quebra uma carapaça. O martelo é duro, e seus golpes machucam. Abandona qualquer idéia de suavidade, de enlevo, de vozes celestiais; só um caminho leva ao Reino de Deus: é o da Cruz. Ficar suspenso, crucificado a uma árvore, é um horrível suplício. Não esperes nada mais. Crucificaste o teu corpo, pregando-o firmemente a um gênero de vida simples e uniforme, impondo a ti mesmo uma estrita disciplina. A atividade mental e a imaginação devem ser, também elas, vigiadas com rigor. Prega-as fortemente com as palavras da oração, a Santa Escritura, a leitura dos Salmos e das obras dos santos Padres, onde todas essas coisas estão prescritas. Não permitas que tua imaginação voe para um lado e para outro, à vontade. As idéias que entusiasmam não passam, em geral, de fugas estéreis para o mundo das ilusões. Quando teu pensamento já não está, de modo útil, ocupado pelo trabalho, chama-o de volta à oração.
Toma cuidado para que tua imaginação e teu pensamento te obedeçam com tanta docilidade quanto um cão bem adestrado. Não permitas que ele fique saltando ao teu redor, latindo; que fuce nas latas de lixo, nem que role no regato. Assim, também deves ter sempre a possibilidade de trazer de volta os pensamentos e a imaginação; e deves fazê-lo inúmeras vezes, a cada instante. Se não o fizeres, diz Santo Antão, serás semelhante a um cavalo montado sucessivamente por vários cavaleiros, sem descanso, e que acaba caindo, exausto e coberto de espuma. Se bates com muita força sobre a casca de uma noz, poderás quebrar também a noz. É necessário agir com precaução. Não comeces com pressa a Oração de Jesus. Não te apresses em te servir dela; e, mesmo depois, continua a dizer as tuas outras orações. Não fiques por demais ansioso. Não creias que, por ti mesmo, possas dizer com atenção um único "Senhor, tem piedade." Tua oração será necessariamente intermitente. Continuas a ser homem; apenas "... os anjos nos céus vêem continuamente a face de meu Pai que está nos céus" (Mt 18:10). Tu, ao contrário, tens um corpo terreno, que reclama o que necessita. Não julgues ter perdido tudo se, no início, esqueceres de orar por algumas horas, ou até durante um dia ou mais. Faz tudo com naturalidade e simplicidade: és um marinheiro sem experiência, que se ocupou de outra coisa com tanta ansiedade, que se esqueceu de prestar atenção ao vento. Assim, nada esperes de ti mesmo. Mas não contes, tampouco, muito com os outros. A concentração é uma coisa; a distração, outra A oração tornará o teu pensamento vivo e claro. Então, as coisas ficarão em ordem. As pessoas que oram vêem tudo o que as cerca, notando e observando cada coisa; mas a perspicácia desse olhar vem da oração, que derrama sobre tudo a sua luz penetrante. Nosso espírito é ativo quando a pureza reina dentro de nós. Enquanto procurarmos estender no coração, esse reino do desapego, nosso ser espiritual continuará a crescer.
A oração produz a paz interior, uma tranqüila calma na tristeza, o amor, o reconhecimento, a humildade. Se, ao contrário, estiveres tenso e agitado, em estado de exaltação ou de desânimo; se sentes abatimento, amargura, ou desejo excessivo de ação; se estás mergulhado num sentimento de êxtase ou na embriaguez dos sentidos, como a que se sente escutando música; se tens a impressão de contentamento e de euforia que te torna "contente contigo mesmo e com o mundo todo," estás no caminho errado. Fizeste repousar demasiadamente o teu edifício sobre ti mesmo. Toca em retirada e volta a reprovar-te; esse deve ser sempre o ponto de partida de toda verdadeira oração. O anjo de luz sempre traz a paz; essa paz que os demônios das trevas querem perturbar a todo custo. É nisso, dizem os santos Padres, que é possível reconhecer os poderes maus, e distingui-los dos bons.

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